Se chegar à Bahia, mais precisamente na Chapada Diamantina e ouvir falar da Machu Picchu baiana não se espante. Estão falando de Igatu, distrito de Andaraí, distante 114Km de Lençóis. A vila que já teve por volta de 15 mil habitantes, conta com menos de 500 e é uma verdadeira cidade de pedra. "Sagrada" pra quem viveu lá durante o auge do ciclo do diamante. Hoje não há farmácias, o hospital mais próximo fica em Andaraí, à 12Km. Em outros tempos quem diria? Cabarés, cassinos, lojas, cadeia, cartório, cinema... hoje, as mais belas cachoeiras, formações rochosas, rica história, hospitalidade e um pouco da cultura nacional.
Mas, por que Machu Picchu baiana? Bem, as ruínas da vila nem de longe se assemelham as ruínas sagradas dos Incas, no Peru. Coincidências a parte, não precisamente em Igatu, mas em um vastíssimo sertão de "uma cordilheira de montes tão elevados, que parecião chegavão à região etherea, e que servião de throno ao vento, às mesmas estrellas (...) principiamos a subir, achando muita pedra solta e amontoada... Estas notícias mando a Vm. d'este sertão da Bahia, e dos rios Paracaçu, Unã... com tudo peço a Vm. largue essas penurias e venha utilizar-se d'estas grandezas (...)" (trechos do Manuscrito 512, documento de 1753 arquivado na Fundação Biblioteca Nacional).
De acordo com a fundação, "Este manuscrito encerra um mistério: a notícia de uma cidade de aspecto clássico perdida no interior da Bahia, a qual tem sido procurada, até agora sem sucesso, por diversos exploradores. Dentre eles, destaca-se Percy Fawcett, que, tendo partido em 1920, desapareceu sem deixar nenhum vestígio". (in http://www.fn.br ) . Fawcett era Comandante da Guarda Real inglesa. Suas expedições inspiraram o cineasta Steven Spielberg a criar o personagem Indiana Jones. O Documento 512 apareceu publicado, em 1839, no Jornal do Instituto Histórico Geográfico Brasileiro.
Acredita-se que Igatu ou Xique-xique (como era conhecida) foi descoberta por volta de 1840, por garimpeiros e eles é que fizeram as obras em pedra que você pode encontrar por lá. Foi um século de exploração e riqueza e a decadência no século 20, quando a maioria das casas foi abandonada. Os próprios garimpeiros chegaram a destruir ruas inteiras em busca dos últimos diamantes o que deu início aos cerca de 7Km de ruínas que hoje podem ser visitadas.
Igatu fica na Serra do Sincorá, seu "desenho" é de infinita beleza, como toda a Chapada Diamantina: vales profundos, chapadões o verde misturado ao cinza, marrom e rosa da secura do sertão. O vento zunindo e o som dos bichos parecem dar voz às pedras. Debaixo de sol escaldante só os calangos, encontrados aos milhares, têm fôlego pra correr.
Atrações
Pra conhecer os atrativos da vila, bom mesmo é ser guiado por um nativo. Nada mau um que dá até nome à cachoeira, o João Taramba, "nascido e criado dentro de Igatu". Ele trabalha guiando os visitantes há doze anos, "há uns meses atrás, descobri uma cachoeira de 110 metros, que já está sendo bem visitada; é a cachoeira dos Cristais", fala com simplicidade e orgulho. Além do trabalho com o turismo, a nova riqueza local, Taramba e outros moradores não dispensam uma garimpadinha. Segundo ele deve existir uns 15 garimpeiros na vila. "Garimpar pesado não pode em lugar nenhum, aqui é tudo preservado, mas manual pode, o Ibama não perturba", conta.
Taramba já chegou a pegar um diamante de oito quilates (cerca de R$ 50.000,00, se fosse encontrada atualmente). "Hoje não tem mais deste tamanho não", enfatiza. Sabe o que ele fez com a dinheiro? Gastou parte viajando. "Fui pra Salvador". Pra conhecer ou visitar parentes? (pergunto). "Pra conhecer. Quase todos meus parentes moram em São Paulo, já tem uns 25 anos". Pra São Paulo não vai? Enfático: "Aí não"! Por um segundo me esqueço da tranquilidade e da possibilidade de respirar e me remeto à São Paulo - falta o ar! Não pela caminhada, pois são apenas 20 minutos sem subida, pra começar a ver as ruínas. Paredes de ex-casas de garimpeiros, tocas, caminho por onde passavam as tropas...
Entre um passo e outro, boas histórias e algumas novidades: "isso aqui vai encher tudo, já compraram tudo. Tá chegando um pessoal tudo gente boa, por enquanto tá bom", comenta sobre a compra de poucas áreas disponíveis na vila. "Vão fazer pousada, restaurante, casa pra ficar de férias", e acrescenta "se não trouxer pessoal de fora (guias), para os nativos vai ser bom".
Logo mais a frente, a igreja do padroeiro local, São Sebastião, feita em pedra. Segundo Taramba, ela foi construída por um garimpeiro que fez promessa para achar muito diamante. Ao lado e na frente do templo, um cemitério, onde está sepultado o corpo do coronel Antônio Gondim, que "comandava o garimpo em Igatu e outros garimpos da região". O comando acabou quando "a lei foi chegando e o exército desarmou ele, aí ele foi adoecendo e acabou morrendo, em 92, com uns 72 anos", conta. Onde funciona a pousada Pedras de Igatu, a única da vila, era a casa do coronel, que foi adaptada.
Cachoeira dos Pombos ou Córrego do meio
Uma das curiosidades da vila é um outro cemitério, o dos Bexiguentos. "Os mais antigos contavam que ali enterravam até gente viva, gente que tinha doença brava", diz Taramba. Segundo ele, essa doença era uma espécie de "Lepra" (Hanseníase). Pra chegar até o local leva-se uns 20 minutos de caminhada, a partir do centro. Os atrativos naturais são muitos. "Pequena cachoeira, coisa de 10 a 35 metros não sei nem contar, porque são muitas", diz o guia.
Cachoeiras Treze Barras e dos Cristais
Pra chegar até a dos Cristais por exemplo você leva umas duas horas. Depois dos primeiros 45 minutos de caminhada você visita a cachoeira Treze Barras, mais uns 800 metros, a dos Cristais.
Cachoeira dos Pombos ou Córrego do meio
Uns trinta minutos, a partir do centro pra se chegar num lugar ótimo pra se refrescar. A queda d'água forma umas "banheiras" de pedra. De vez em quando os locais fazem pique-nique por ali.
Cachoeira do Taramba
Descoberta pelo João, para chegar até ela você passa pelo Córrego do Meio, pelo Cemitério dos bexiguentos e mais uns 40 minutos de caminhada. Assim como a cachoeira dos Cristais, a do Taramba forma um belo poço.
Santo Antônio
Formação rochosa que lembra a imagem de santo Antônio. São cerca de uma hora caminhando. No caminho é possível também ver outras formações que parecem carros por exemplo - é como adivinhar o que parece aquela nuvem. Se estiver meio sem tempo é melhor deixar pra depois.
Rampa do Caim
Cerca de três horas caminhando para se chegar a um local que dá uma das vistas mais espetáculares do Vale do Pati e os rios Paraguaçu e Preto, ambos com suas águas escuras. A trilha é boa e a chegada nem se fala, mas é preciso estar muito "zen" pra curtir a trilha. É preciso estar muito atento pois há muitas pedras soltas e escorregadias e um tombo ali não ia ajudar em nada. A chegada pede um ou mais minutos de silêncio (contemplação, agradecimento a Deus, é pra ouvir o silêncio e a grandiosidade da natureza). Dalí é possível seguir adiante, fazendo uma trilha que passará pelo Pati, Capão e Palmeiras, outras áreas imensamente lindas da Chapada Diamantina. A Rampa do Caim e a trilha estão sendo exploradas também por agências locais.
Dicas
Para qualquer passeio que vá fazer pela região leve muita água, proteja-se do sol (boné, filtro solar) e vá com roupas leves e calçado confortável. O clima em Igatu engana: pela manhã chega até ser frio, quando chega às 10h o calor já está insuportável. De novembro a janeiro é a época de chuvas.
Quem vai à Igatu não pode deixar de dar uma passada nas casas de duas personalidades locais:
Lindaura Nascimento Moura
Filha de Alzira Nascimento, já falecida, uma das mulheres do garimpo. A casa foi a primeira a receber turistas na vila e tem algumas peças antigas e o que dizem ser amostras de diamantes. O café com bolinho de chuva e a folheada no álbum de fotos da casa são boa pedida, além da possibilidade de comprar algum souvenir produzido por Lindaura e família: lindas miniaturas de igrejas e casas, trabalhadas na pedra e bolsas, tapetes e acessórios em crochê. A casa fica na rua 7 de setembro.
Amarildo dos Santos
Criatividade é a marca deste professor, atualmente comerciante e escritor. A placa da fachada de seu estabelecimento, que também é sua casa (onde vive com a mulher e uma filha) já mostra um pouco da criatividade: "Ponto: Entre e compre algo (...)" Essa placa ficou famosa na web e apareceu em um dos programas do Jornalista José Simão da FOlha de São Paulo, O Monkey News. Em seu bazar é possível comprar licores dos mais variados sabores e os interessantes livros que Amarildo escreve à mão, com caneta azul e vermelha, no maior capricho. Vale comprar um como lembrança (e por que não leitura, fonte de pesquisa?) de uns dos lugares mais inusitados do país. No ponto do Amarildo também é possível ver fotos dos famosos que já estiveram por lá, os autógrafos, revistas etc.
Onde comer?
Pousada Pedras de Igatu
Pra quem ficar hospedado, um excelente café da manhã. No local também funciona um restaurante que serve diversos pratos e lanches. O espaguete (prato mais barato do local) serve duas pessoas e é uma delícia.
Restaurante da Norma
Fica na rua principal da vila.
Pizzaria
Em frente a praça. É a única da vila, de propriedade de um argentino. Também vende camisetas, mapas e outros souvenirs.
Na casa do João Taramba
Na sala da casa simples, a mãe do João serve a refeição preparada mediante pedido antecipado. (Se quiser jantar lá, combine o preço e o prato pela manhã).
Pratos típicos
Salada de Batata da Serra
Tipo de batata meio doce e aguada. Segundo o Taramba é boa pra saúde (contra o diabetes e o colesterol). A batata é típica da região.
Godó
Prato feito com carne de sol picada e banana verde.
Cortado de Palma
A mesma Palma utilizada para alimentação de bovinos, com a criatividade do povo sertanejo se transformou em um dos pratos típicos da região. A Palma é refogada e misturada com carne de sol.
Onde Ficar
Pousada Pedras de Igatu
Rua São Sebastião, s/n.
Além de pousada e restaurante, também conta com alguns souveniers para venda.
Estalagem Gota d'Agua
Praça Central, S/N
http://www2.uol.com.br/mochilabrasil/estalagemgotadagua.shtml
Pousada e Camping Flor de Acunena
Rua nova s/n. Vila de Igatu - Andarai
http://igatur.googlepages.com/
Como chegar?
Pode-se chegar a partir de Andaraí, passando pela estrada antiga, com sete quilômetros de subida, toda calçada com pedras. Ou, a partir de Mucugê, indo pela BA-142 e depois pegando o pequeno acesso de terra.
Trilha Andaraí-Igatu - Rio Coisa Boa (poço para banho), 11 Km percorridos em 3 h de caminhada de média dificuldade. O acesso à região pode ser feito por via terrestre através da rodovia BR-242 (Salvador - Brasília) e dentro da mesma por rodovias estaduais pavimentadas que a ligam às cidades de Lençóis, Palmeiras, Andaraí, Mucugê e Barra da Estiva. Outras localidades podem ser alcançadas por estradas vicinais sem pavimentação; as estradas entre a rodovia BA-142 e a vila de Igatu são pavimentadas com lajes de pedra.
Trabalhadores, estudantes e viajantes, no único meio de transporte em Igatu: O Ônibus Escolar.
segue para Igatu. Nós pegamos carona com o ônibus escolar, mas existem táxis que levam até a vila.
0 comentários:
Postar um comentário